28/12/2014

Do Aço e suas Implicações


Um tratado, um estudo, uma resenha, no mínimo, sobre a importância das rimas poéticas com "aço" é o mínimo para se viver uma vida de pseudo-escritor. 

Aço é uma puta palavra que designa todo conjunto de nervos de alguém que more em uma cidade onde se mata como se toma um sorvete. 

Aço é aço e contra aço só fogo - e fogo dos bons. Não tem calma não, não tem jeitinho, não tem paciência não - aço é cortante, aço pode matar, cegar, aleijar - mas também constrói e transforma. Sei que esse clichê da dualidade das coisas está há muito já passado, eu sei, mas o que eu tô tentando dizer é:

as vezes tem que ser aço e não abraço, nem laço, nem traço. 

É só aço que faço e só aço que rezo quando o compasso descompassa - e isso não passa assim não, essa situação que exige ação; que nem papel, o aço não dobra não. Não é rima de amor com dor, não é poema nem palavra, aço é ação, aço é foda, é foda mesmo.

21/10/2014

Outros Deuses

E você vem me falar que tinha um cabelo no seu hambúrguer?
Eu venerei a dúvida e outros Deuses piores que a dúvida.
Eu, produto de uma soma torta, de uma equação sem raízes, eu gritei: A vida é uma provocação! PRO-VO-CA-ÇÃO.
Eu, moldado por uma visão imperfeita: sequestrado por um olho que não enxerga e por outro que insiste em enxergar, mas dá trabalho; um olho único que venera também a dúvida de funcionar, que tem medo de levar pedrada - seja física ou imaginada.
Eu mesmo, Felipe Celline. Eu fui lá e tirei fotos, eu fui lá e olhei tudo o que tinha pra olhar, escrever tudo o que tinha que escrever e o que não tinha... eu inventei! "Vidi Vini Vinci" é o caralho. Eu quero vencer sem ver nada. Eu quero passar a mão na vida. Quero tocar, bem pertinho, a vida.

Eu quero é comer o cabelo, o hambúrguer e a borda da mesa! Quero morder uma rua inteira;
quero lamber vidas inteiras de uma vez só.

14/10/2014

Antropocertos

Sempre eles e nós. Nós nunca somos eles, ai de nós! A gente se divide: são as pessoas do outro trem, da outra rua, de outro estado. São sempre eles, eles! e nunca nós. São os viados, as putas, os travecos, os caipirias, os negros, as mulheres, os favelados, os vagabundos, os bêbados, os loucos, as mal comidas, os mal amados, é falta de sexo, é nariz empinado, é feito de trouxa, é burro, é inteligente mas tem bafo, é imoral, é vil, é depressivo, é triste, é meio assim estranho - sempre os outros, sempre eles. Nós não.
Não se mistura assim, a gente pensa - não se faz isso, tem que tomar cuidado pois ser corrompido é fácil. Somos diferentes e não somos aquilo; somos outra coisa (coisa... sim, outra coisa). Acontece que uma hora nós viramos um eu-sozinho - depois de tanta particularidade e tanto diagnóstico da vida. Seguimos as prescrições certinho. Depois de tanta regra criada para uma amizade, um romance, um emprego, uma família, uma saída ao milk-shake para conversar! Que grandes muros são esses que construimos diariamente! Ora, que é a vida, ein? E mais: Que é o medo da vida.
Então pergunto e tento: Grandes reis sempre são mostrados dentro de castelos murados e protegidos em tronos maciços. Tudo tão sólido! Por que acreditamos ser reis na vida - príncipes, tantas vezes? Não temos tijolos, muros ou pontes levadiças. Olho para minhas mãos e vejo só um punhadinho de areia e as pessoas que me cercam também: Tentando conter nas mãos a areia tão seca e esvoaçante.
O que um rei poderia fazer com um punhado de areia? Imagina que desesperador para homem tão nobre: Castelinhos de areia , para usar a metáfora tão clichê dos castelos de areia destruídos - coisa que não me preocupa usar mais num texto ou numa vida (tanto faz), pois, ao perceber o quão incerto é o meu punhadinho de areia já não me preocupo com a erudição textual, gramatical e seja lá o que for. Não consigo mais ser sério em algo sem me achar tolo.
andarilho da vida - príncipe jamais de novo.

05/07/2014

O Mar do Mundo

Eu sou só alguém, viu. Algas no mar de algo
e os peixes - pretensos peixes -  tem fome.

28/06/2014

Depois de ler tantos conselhos na linha de tempo do facebook - vindos de gatos, bebês e pessoas andando na chuva (em fotos preto e branco) - eu quis escrever um poema, mas não consegui. 
Me senti preparado demais para a vida.

13/05/2014

Ficou uns dez segundos tentando achar a menina de cabelos compridos dentro daqueles olhos preguiçosos. A mente voa lá para os dezepoucos anos. Volta tão rápido que é de se assustar: na sua frente uma mulher inteira mesmo, com roupas e cheiro e trabalho de mulher. Ela fica encarando os olhos dele brilhando molhados “– Êee, que que você vai chorar agora, ein menino?”

Ele, sempre tão barbudo, sempre tão escondido atrás de grossos óculos, demorava muito tempo para dar conta da passagem do tempo. Contava nos dedos da mente e ia lembrando distraído de um dia e outro. Como podia aquela menina ter virado uma mulher assim “plop”!? “- É que eu lembrei, dona menina, de um dia que você me beijou a mão na porta da escola.”

Ela ria tão descarada e sincera – igualzinho sua irmãzinha pequena. Não era fazendo troça, mas era rindo do mundo. Estava dentro de uma roupa que era sempre cheirosa e apontava com o indicador para os cabelinhos que desciam de suas costeletas, ainda rindo: “-Dá um cheiro aqui, ó.”

Ela tinha um rosto de menina arteira, com sobrancelhas hiperativas e afiadas. Era linda quando sorria um sorriso escancarado de incontáveis dentes brancos – e mais linda ainda quando estava séria e concentrada em algo ou sendo muito brava. Com uma pele cheia de pintinhas, as pernas compridas e bem feitas eram um convite para andar pela vida. Dava de teimar com a vida às vezes “-Tô desanimada com tudo, sei lá.”, mas ria se achando esquisita depois.

Ele, que se achava tão de extremos, de ferro e de fogo, de fortes (e pretensas) opiniões e palavras, ficava iluminado pelo exemplo de não levar a vida toda sempre a sério – de não triturar a vida nos moinhos do pensamento de novo e de novo. A simplicidade da vida o ganhou, juntamente com os pés sempre tão frescos e de unhas pintadas. 

09/05/2014

Depois de alguns meses trancado em casa devido a um repouso pós-cirúrgico, eu quis sair para ver o mundo outra vez.

Fiquei extremamente ansioso no dia em que o médico me liberou e a primeira coisa que fiz foi subir minha quieta rua sem saída. Percebo então, ao dobrar a esquina, que o mundo continuava lá, inabalável e excessivamente mundo. Os senhores do boteco ainda jogavam dominó e as pessoas dentro dos carros ainda ficavam estranhamente egoístas às dezoito horas – “horário de pico”.

Então eu voltei pra casa e não consegui entender mais nada.

17/04/2014

Duzentos Quilos de Mundo

Naqueles tempos a vida era mais simplória - não uso a palavra "simples" pois era de fato complexa, mas os desejos eram mais bobos. A gente queria tocar violão nos sábados e mostrar as músicas que aprendemos na semana, jogar video-game e andar pelo supermercado fazendo piada de tudo.
Então depois de uns dez anos nós crescemos e, sendo adultos, os desejos ficaram maliciosos e pervertidos. Passamos a querer o mundo nas nossas mãos, mas quase sempre ele escapa e fica bem em cima de nossas costas, o que nos rende grandes dores.
 São assim então as grandes aventuras e ambições da vida adulta? Carregar duzentos quilos de mundo todo dia. duzentos quilos de terra, aliás, pois não há um traço humano ou vivo em nossos mundinhos de lama. Ninguém nos contou essa parte do trabalho inútil, da hora-extra, das obrigações inadiáveis para com os almoços de domingo.

13/04/2014

Já fui escombro no mundo e poeira nos cantinhos da vida.
Peguei cada caquinho de mim mesmo no chão e me reconstruí como quimera de sorrisos fáceis e vida normal. Permaneci rachado como vaso quebrado de avó, mas bem colado; compacto.

27/01/2014

Os Couros

Fez um sol tão forte que os couros do fazedor de tambor estouraram de tão esticados. O samba dos pandeiros ficou mais rápido e os atabaques só podiam tocar Barra-Vento. Zé Amarildo foi obrigado a colocar graxa nos ganchos de sua rede. Ninguém foi pra roça por dois meses - e quem foi, por lá ficou, feito árvore de Cerrado dos desenhos que aparecem nos livros de Guimarães Rosa.

16/01/2014

Anais da Vida


Perdi tempo demais tentando escrever coisas profundas e o café - tão clichê para um escritor - esfriou.
Quis falar sobre as pombas sujas nos fios de luz. Elas cagam em nossas cabeças tão cheirosas de shampoo. E isso me pareceu terrivelmente triste. Então quis falar da vida, mas estava tentando parecer inteligente
e não consegui.