Aos trinta anos entrou num bar qualquer e comprou seu primeiro maço de cigarros.
- Opa, beleza?, - Beleza! e coçava a calva da cabeça ao passar os olhos pelas marcas. Para melhor decidir pediu para ver um ou outro mais de perto. Saltou um "CÂNCER!" em preto e amarelo de uma das embalagens colocadas sobre o balcão. O atendente se desculpou, visivelmente embaraçado pelo anúncio fúnebre e então virou a embalagem pra baixo rapidamente. Agora sim o rótulo certo e que convinha: Lucky Strike, embalagem colorida.
- Me vê um desses, disse o aventureiro apontando para a caixinha. Caixinha não! Maço. Tinha a segurança plástica dos amadores. Assertivo além da conta e teatral.
- Opa, beleza?, - Beleza! e coçava a calva da cabeça ao passar os olhos pelas marcas. Para melhor decidir pediu para ver um ou outro mais de perto. Saltou um "CÂNCER!" em preto e amarelo de uma das embalagens colocadas sobre o balcão. O atendente se desculpou, visivelmente embaraçado pelo anúncio fúnebre e então virou a embalagem pra baixo rapidamente. Agora sim o rótulo certo e que convinha: Lucky Strike, embalagem colorida.
- Me vê um desses, disse o aventureiro apontando para a caixinha. Caixinha não! Maço. Tinha a segurança plástica dos amadores. Assertivo além da conta e teatral.
Isqueiro
já tinha, pois tudo foi antes planejado. Fumar um cigarro podia ser
coisa pouca, mas ser quem nunca se foi? Isso era um gozo completo. Ele
era uma pessoa das normatividades, do protocolo social e de comer uma
laranja por dia para não gripar. Ser outra pessoa, mesmo que fingindo, é o esporte preferido da humanidade, daí o ritual aqui descrito.
Impulso tardio de adolescente? Não, mas se sim, tudo bem, pois ele
sentiu a alegria de quem faz algo pela primeira vez depois de muito
tempo.
Para conferir ar cinematográfico ao acontecimento, pensou em fazer a pé o caminho usual do ônibus que o levava do trabalho para casa. Tinha a mania de catalogar na cabeça lugares comuns que passava no dia a dia e que, por algum motivo banal, gostava.. Até dava nomes diferentes para ruas, avenidas e prasças. "Rua das Árvores" era o nome inventado desta onde agora estava. Sabia que o nome era bobo e ria de si mesmo ao pensar nele.
De passo calmo ia estranhando o volume quadrado e pontudo. Nesses bolsos nunca passaram nicotina, alcatrão e outras 4.700 substâncias tóxicas. Pensar isso era excitante e um bom começo para algo grandioso. Abriu o difícil lacre do maço com a delicadeza de uma máquina industrial e colocou o cigarro entre os dedos inábeis. Acendeu e sugou apertado como se fosse um canudinho. Tragou como havia lido na internet ontem de noite: "Puxe e prenda o ar como se fosse mergulhar dentro d'água, fazendo assim a fumaça preencher os pulmões".
E mergulhou. As mãos ficaram sem lugar certo, balançando como as de um menino. Não sabia se pegava o cigarro da boca, se o deixava lá, se colocava as mãos no bolso, se parava ou se continuava a andar. Nessa pequena luta onde o corpo tenta se acostumar ao novo, foi fumando repetidamente por vários metros. Voltou o cúmplice para polegar e indicador. Parecia segurar um inseto vivo na ponta dos dedos. Bateu a cinza não se sabe com que dedos, mas com tamanha força que a cinza explodiu no ar. Então a luz do sol poente se encontrou com o mar de cinzas que reluziam como vidrinhos coloridos. Refletiu-se toda a cena numa gota de orvalho inventada e uma pomba grunhiu e as árvores chiaram: acontecia algo.
Foi tomado de uma sensação plácida e tonteante. Pensou que ia cair, pois a visão turvou um pouco. Tibum! Sentiu-se inserido no momento presente, o coração batia conforme o ponteiro dos segundos e foitomado de uma surpreendente consciência da pressão que seus pés exerciam no chão e das marcas que sua vida deixava no mundo e nas pessoas. Então esse era o efeito, o mundo se desacelerando. Sua tia, a clássica tia fumante, sempre falava ao ser questionada dos porquês do fumo "-Não acontece nada, é só por costume".
Quem passou os olhos até aqui percebe que a história caminhou com os mais estranhos detalhes. Vejo-me então obrigado a relatar o desfecho inevitavelmente humano da mesma, mas antes rogo ao charuto aceso do psicanalista para que coloque algum luz neste ocorrido. Desculpo-me, também, por não usar termos próprios da literatura médica ou biológica, pois se o fizesse se perderia totalmente o sentido. Seguimos, pois: Quando ele soprou a fumaça do último trago, viu se desfazer a fumaça no ar. Algo o apertava por dentro. Olhou para baixo num gesto de muita surpresa e percebeu que estava com o pau duro.
Para conferir ar cinematográfico ao acontecimento, pensou em fazer a pé o caminho usual do ônibus que o levava do trabalho para casa. Tinha a mania de catalogar na cabeça lugares comuns que passava no dia a dia e que, por algum motivo banal, gostava.. Até dava nomes diferentes para ruas, avenidas e prasças. "Rua das Árvores" era o nome inventado desta onde agora estava. Sabia que o nome era bobo e ria de si mesmo ao pensar nele.
De passo calmo ia estranhando o volume quadrado e pontudo. Nesses bolsos nunca passaram nicotina, alcatrão e outras 4.700 substâncias tóxicas. Pensar isso era excitante e um bom começo para algo grandioso. Abriu o difícil lacre do maço com a delicadeza de uma máquina industrial e colocou o cigarro entre os dedos inábeis. Acendeu e sugou apertado como se fosse um canudinho. Tragou como havia lido na internet ontem de noite: "Puxe e prenda o ar como se fosse mergulhar dentro d'água, fazendo assim a fumaça preencher os pulmões".
E mergulhou. As mãos ficaram sem lugar certo, balançando como as de um menino. Não sabia se pegava o cigarro da boca, se o deixava lá, se colocava as mãos no bolso, se parava ou se continuava a andar. Nessa pequena luta onde o corpo tenta se acostumar ao novo, foi fumando repetidamente por vários metros. Voltou o cúmplice para polegar e indicador. Parecia segurar um inseto vivo na ponta dos dedos. Bateu a cinza não se sabe com que dedos, mas com tamanha força que a cinza explodiu no ar. Então a luz do sol poente se encontrou com o mar de cinzas que reluziam como vidrinhos coloridos. Refletiu-se toda a cena numa gota de orvalho inventada e uma pomba grunhiu e as árvores chiaram: acontecia algo.
Foi tomado de uma sensação plácida e tonteante. Pensou que ia cair, pois a visão turvou um pouco. Tibum! Sentiu-se inserido no momento presente, o coração batia conforme o ponteiro dos segundos e foitomado de uma surpreendente consciência da pressão que seus pés exerciam no chão e das marcas que sua vida deixava no mundo e nas pessoas. Então esse era o efeito, o mundo se desacelerando. Sua tia, a clássica tia fumante, sempre falava ao ser questionada dos porquês do fumo "-Não acontece nada, é só por costume".
Quem passou os olhos até aqui percebe que a história caminhou com os mais estranhos detalhes. Vejo-me então obrigado a relatar o desfecho inevitavelmente humano da mesma, mas antes rogo ao charuto aceso do psicanalista para que coloque algum luz neste ocorrido. Desculpo-me, também, por não usar termos próprios da literatura médica ou biológica, pois se o fizesse se perderia totalmente o sentido. Seguimos, pois: Quando ele soprou a fumaça do último trago, viu se desfazer a fumaça no ar. Algo o apertava por dentro. Olhou para baixo num gesto de muita surpresa e percebeu que estava com o pau duro.