13/08/2015

Crônicas de Alface


         Plantei uma alface. Uma só, bem no meio da terra poeirenta e esquecida do quintal. Sol e chuva, ela cresceu grande e forte. Tão mais viva do que as amareladas do mercado! Até fiquei com dó. Arrancá-la dali seria arrancar a pontinha de esperança de algo mudar no mundo. No mundo de um quintal, pelo menos. Tirar o ponto verde do mar de poeira seria admitir a derrota certa e irreversível da natureza. Então ela cresce, cresce e cresce. 

         Até onde, meu Deus? Até onde vai essa alface? Acontece que após meses fiquei pasmo. Reação digna de quem cresceu na megalópole. Vi que do meio da alface despontou um caule firme e reto como uma árvore. Dele ramificaram-se dezenas de flores amarelinhas muito delicadas e sem graça. Bobas e ofuscadas, ficaram sendo as mais lindas que já vi. Eu havia sido privado da totalidade de uma alface durante toda a minha vida; percebi que eu não sabia de nada e nunca soube.

         Quem diria que depois de tanto nesta vida eu, já tão amassado pelos martelos da conformidade, teria que lidar com isso; flores de alface. Contei pra todo mundo que conheço, tirei muitas fotos iguais, mas ninguém pareceu realmente entender a proporção dessa descoberta. Flores de alface, meu leitor urbano. Pense nisso.